terça-feira, 8 de março de 2022

CARRO BICHO [AMOSTRA GRÁTIS]


CARRO BICHO

ou SÓ CORO COM COÇA



[ESSA HISTÓRIA SE PASSA NO TEMPO PASSADO]

A história de como eu dei a bunda pela primeira vez é um pouco louca. Foi mais ou menos na época que eu tinha 18 anos e rolou de um jeito totalmente inesperado, com um cara um pouco mais velho e que eu nem conhecia direito. Naquele tempo eu ainda morava com a minha mãe adotiva numa ruazinha quieta e sossegada do subúrbio, sendo que eu chegava do curso no fim da tarde, antes dela, então passava algumas boas horas do começo da noite sozinho. Normalmente aproveitava esse tempo pra preparar a janta e ver o jornal, depois às vezes ia pro portão fumar um cigarro quando tava muito calor, porque dentro de casa era abafado. O bairrinho ainda não era perigoso como é hoje, mas alguns moradores já tinham câmeras de segurança nos muros de suas residências, sendo minha mãe uma dessas pessoas.

          - Olha, garoto, vê se você toma cuidado quando tiver entrando e saindo de casa, ouviu? – ela chamou minha atenção uma vez. – Presta bastante atenção na rua e não dá mole, que o negócio tá ficando difícil por essas bandas.

          - O que aconteceu?

          - Ué, não ficou sabendo? Tem um carro preto circulando nas ruas do bairro e assaltando quem anda sozinho. Toma cuidado, ainda mais você que adora andar com esse celular na mão.

          - Ih, relaxa, mãe. O perigo sou eu. – brinquei.

          - Ah, é, é? Sei. Toma vergonha nessa cara, menino!

          - Eu é que sei. Ninguém é maluco de mexer comigo, não, pode ficar tranquila. Hahahahaha!

          Não levei os comentários dela tão a sério, até porque o subúrbio é e sempre foi cheio dessas lendas urbanas nas fofocas entre os vizinhos. Em menos de uma semana, esse assunto do tal carro preto acabou se espalhando de boca em boca e em cada portão da minha rua, até que as pessoas no bairro estavam todas atentas a qualquer veículo escuro que virava a esquina. O número de gente circulando começava a diminuir pouco antes de escurecer, porque ninguém queria ser a próxima vítima na mão do assaltante do carro preto. Numa noite quente e aleatória dessas, minha mãe voltou a falar do assunto comigo, só que dessa vez a fofoca estava maior.

          - Não tá sabendo, filho? O pessoal anda dizendo que o homem do carro preto sequestrou uma mulher na rua de trás anteontem e ficou com ela durante a madrugada toda, só devolveu a coitada de manhã!

          - Mentira?! Quem falou isso, mãe?

          - Não pode contar pra ninguém, tá? – ela pediu.

          - Claro que não vou contar. Quem te falou?

          - Foi a Soninha. Tive com ela hoje à tarde e parece que tá todo mundo preocupado e com medo, meu filho. Você, pelo amor de Deus, não dê mole.

          Soninha era uma das nossas vizinhas, talvez a mais fofoqueira delas. Mãe solo, solteirona de meia idade e com muito tempo livre, a cinquentona era uma das que mais inventava boatos a respeito dos outros, sendo que até a minha mãe já tinha sido vítima dela uma vez, logo quando nos mudamos pro bairrinho. Levando essas circunstâncias em consideração, confesso que não acreditei na história de sequestro logo de cara, porém não quis que minha mãe percebesse que eu não tava levando a fofoca dela a sério.

          - E vem cá, como é que tá a tal mulher que foi sequestrada? – fiquei curioso.

          - Falaram que ela tá bem, tá em casa descansando.

          - Bem? Como que a mulher é sequestrada, fica a madrugada toda de refém do assaltante e acorda bem?

          - Ah, eu não sei bem dos detalhes, menino. Deixa de ser fofoqueiro, ôxe!

          - “Eu, né?” – respondi mentalmente.

          Acabamos de jantar, eu guardei a comida da panela na geladeira e juntei a louça pra lavar. A novela das nove terminou, entrou a vinheta do BBB e o apresentador começou a anunciar sobre as coisas que aconteceram debaixo do edredom do quarto do líder na última festa. A noite tava quente e abafada, lembro que esperei minha mãe dormir, não me aguentei e fui pro portão fumar um cigarrinho. A rua sem um movimento sequer, nem gato passava por ali, de tão parado o lugar. Não demorei tanto tempo, fiquei no máximo uns três minutos fumando e me preparei pra entrar, foi aí que escutei o barulho de pneu cantando, olhei pra esquina e vi o Corolla preto acelerando com tudo.

          - Puta merda, será que a fofoca é verdade!? – tomei um puta susto.

          Entrei pelo portão, passei a chave e o barulho aumentou, sendo acompanhado por um som alto de funk proibidão explodindo nas caixas do veículo. Meu coração disparado, eu escondido atrás do portão e ouvindo o carro preto passar acelerado na frente da minha casa, até que a barulheira diminuiu um pouco e me deu a impressão de que o suposto assaltante havia parado perto da minha calçada.

          - Será que... – pensei em abrir o portão e bisbilhotar, mas o medo foi maior e tive uma ideia melhor. – Já sei!

          Voltei correndo pra dentro de casa, cheguei na sala e me joguei no sofá. Peguei o controle da TV, liguei o circuito de vigilância e tive acesso a tudo que a câmera do muro da minha casa filmava. Logo de cara já deu pra ver o Corolla preto parado duas casas depois da minha, perto da calçada e ligado, como se estivesse esperando por alguém. Demorou uns dois minutos e foi aí que vi o vulto moreno pulando o muro de uma casa, correndo e entrando no veículo suspeito.

          - Meu Deus do céu! Aquilo ali é...

          Não acreditei no que meus olhos viram. Assim que o vulto entrou no carro, o Corolla disparou e, mesmo estando dentro de casa, consegui ouvir o barulho dos pneus cantando lá na rua, talvez na hora de passar acelerado pelo quebra-molas da esquina. O funk alto também subiu, mas logo todos os barulhos sumiram e o veículo escuro desapareceu completamente do campo de alcance da câmera de segurança. Eu fiquei tão curioso e assustado pelas coisas que vi, que acabei pegando pipoca, refrigerante e basicamente montei acampamento na sala, de prontidão pra ver como seria o desfecho daquilo que não pareceu muito bem um sequestro.

          - Será que vão voltar? Hmmm, tá ficando tarde...

          Deu meia noite, uma da manhã, duas, três e nada aconteceu. Já tinha pensado em desistir e ir dormir, quando, por volta das 3h30 da madrugada, fui no portão fumar outro cigarro e tomei um susto com o barulho do funk proibidão explodindo na esquina. Não passou um segundo e veio também a barulheira dos pneus do carro cantando, me obrigando a voltar pra dentro de casa e correr pra bisbilhotar na câmera de segurança mais uma vez. Cheguei na sala, olhei pra tela da TV e novamente o Corolla parou umas casas depois da minha, onde permaneceu ligado, agora em silêncio e sem qualquer sinal de movimentação interna. Foi aí que a porta do carona abriu e, pela segunda vez seguida, o vulto moreno passou do veículo pro portão da casa, tomando impulso pra pular o muro. Dessa vez eu consegui ver exatamente quem era.

          - Puta que pariu, eu sabia! – quase dei um berro na sala. – É a Stephanie, com certeza é ela!

          Stephanie era a filha da vizinha Soninha, uma moça de uns 20, 21 anos de idade, alta, bundão grande, cabelo de franjinha na testa e óculos de fundo de garrafa, com a maior cara de nerd santinha. Pelo visto ninguém sabia das fugidas que ela tava dando de madrugada com o tal assaltante do carro preto, nem a própria mãe dela, e tudo isso só me deixou atento e mais curioso ainda. Na ponta dos pés, a Stephanie pulou o muro de casa no mais completo silêncio possível, entrou no meio do escuro e sumiu. Só depois disso que o veículo suspeito saiu do portão dela e foi embora, dando a entender que quem quer que estivesse ali dentro estava tramando e fazendo coisas com a filha da minha vizinha, tudo em sigilo.

- Esse pessoal tá aprontando alguma coisa, ô, se tá... – resmunguei comigo mesmo, me comendo de curiosidade pra descobrir o que era.

No dia seguinte, mesmo eu não tendo contado nada pra ninguém, eis que cheguei em casa antes da hora, minha mãe já havia chegado e estava na sala conversando com a Soninha. Como eu tava muito curioso e não esperei encontra-las juntas, cheguei no sapatinho, sem ser percebido, e escutei um pouco do papo antes de entrar na sala.

- Aí é isso, menina. Tô preocupada que a Stephanie teja se envolvendo com algum desses moleques sem futuro.

          - Sério, Soninha? Mas por que?

          - Ela tá mentindo pra mim, eu tenho certeza.

          - Stephanie mentiu pra você? Quando?

          - Essa madrugada, mulher! Eu acordei com um barulho no portão, aí fui olhar na janela e vi um vulto, acredita?

          - Um vulto? – minha mãe ficou assustada.

          - Pois é, fiquei preocupada! Já tava todo mundo dormindo, não quis acordar ninguém. Eu levantei e fui no quarto da Stephanie...

          - E aí, ela tava com alguém?

          - Não, ela tava parada no corredor, em pé, mexendo no celular. Tomei um susto, né? Perguntei o quê que ela tava fazendo acordada àquela hora e a bicha foi esperta.

          - O que ela falou, Soninha? Conta logo, mulher!

          - Disse que levantou porque também ouviu um barulho no portão. – nossa vizinha fez cara de dúvida e franziu um pouco os olhos, com semblante de muito desconfiada. – Mas eu sei quando aquela menina mente, toda mãe sabe. Você não sabe quando teu filho mente?

          - Ô, se sei! Claro que sei, aquele ali nunca me engana. Nem se nascesse de novo, hahahahaa!

          Do lado de fora, ouvi isso e tive que pôr a mão na boca pra segurar a vontade de rir, porque eu sabia exatamente o que tinha acontecido, sabia que a Stephanie tava aprontando na rua em plena madrugada e sem a mãe dela saber. Aproveitei a deixa, fiz barulho, abri a porta e entrei pela sala, com as duas olhando pra mim e me cumprimentando na mesma hora.

          - Oi, oi. Boa tarde! – fui educado, como sempre.

          - Oi, querido. Tudo bem?

          - Tudo, mãe.

          - Boa tarde, Félix, tudo bom?

          - Boa tarde, dona Soninha. Tudo joia. E a Stephanie, como é que tá? – fingi que não sabia de nada.

          - Tudo indo, ela tá bem. Estudando muito...

          - Ah, que bom! É isso aí, não pode parar. – dei um sorriso.

          - Chegou há muito tempo, meu filho? – mamãe ficou curiosa.

          - Não, acabei de chegar. – menti na cara dela. – Saí um pouco mais cedo, aí vim direto pra casa.

          - Bom que você chegou agora. – ela alisou meu rosto e sorriu. – Vai comer, tem bolinho de feijoada no forno.

          - Obrigado. Vou tomar um banho primeiro, dá licença, gente.

          - Toda, meu filho.

          - Vai lá, Félix. – a vizinha falou.

          Saí dali, deixei as duas papeando na sala e fui pro banheiro, mas ainda deu pra ouvir o fim da conversa sobre a Stephanie.

          - Seu filho é um amor, diferente da Ste. Queria que aquela sonsa fosse mais minha amiga e me contasse o que ela tá aprontando, sabe? – confessou a coroa.

          - Mas vem cá, você acha mesmo que ela tá fazendo alguma coisa, Soninha?

          - Claro que tá, é certo! Minha intuição não falha, conheço a minha filha. Eu vejo na cara da safada a mentira. Acho que ela tá saindo com algum desses moleques irresponsáveis e não quer me dizer.

          - Quem será, então?

          - Ainda não sei, mas suspeito que seja aquele tal de Cenoura. Stephanie só fala desse menino ultimamente, é o tempo todo Cenoura isso, Cenoura aquilo, Cenoura pra lá, Cenoura pra cá. Não aguento mais!

          - Putz, mas logo pelo Cenoura? Que merda, Soninha! – minha mãe foi sincera até demais no lamento.

          Fechei a porta do banheiro nesse momento, parei de ouvi-las, mas todas as informações que escutei foram suficientes pra me fazer refletir bastante dentro do boxe, porque eu conhecia um Felipe. Melhor dizendo, eu já tinha ouvido falar do Felipe Cenoura e o conhecia só de vista, por vê-lo passar várias vezes de moto na minha rua. Ele era um dos caras mais velhos da galerinha do meu bairro, devia ter uns 24, 25 anos, trampava de mototáxi na parte baixa do bairrinho e também fazia serviços de entrega de comida, tipo motoboy.

          - Será que a danada da Stephanie tá dando mesmo pro Felipe? – perguntei a mim mesmo enquanto me ensaboava e pensava nos dois juntos. – Nossa, que loucura...

          Felipe chamava atenção por vários motivos: pra começar, ele tinha o corpo magro e bastante alto, esguio mesmo, dos ombros largos e pontudos; a pele clara, mas com vários traços considerados negroides, como os lábios carnudos e o nariz meio largo; seu cabelo era enroladinho, estilo black power curto e disfarçado no corte do jacá nas laterais; o apelido de Cenoura era por conta dos pelos do corpo serem ruivos, como se ele tivesse feito reflexo avermelhado em tudo. Não era só o cabelo da cabeça, a barbicha no queixo e os pelos da perna também, assim como das axilas e, portanto, se eu pudesse chutar, diria que até seus pentelhos do saco e do púbis também eram na mesma tonalidade. Uma das sobrancelhas tinha um risco e o braço era fechado de tatuagens, parecendo até com o DJ FP do Trem Bala, exceto pela pele clara e os pelos vermelhos. Como o Cenoura era um cara que já tinha moto e andava de carro, era hábito vê-lo passar a mil por hora na rua, geralmente com alguma moça de roupa curta na garupa e deixando o rastro do cheiro de maconha pra trás, por isso que ele era considerado o terror das vizinhas.

          - “Se eu fosse a Stephanie, será que eu também daria pro Felipe?” – pensei alto, enquanto me enxugava após o banho. – “Ele é magrelo, mas é gostosinho. Será?”

          Depois que vesti minha roupa e penteei o cabelo, saí do banheiro, peguei meu celular e fui direto na rede social procurar pelo nome do Cenoura. Não levei nem um minuto e lá estava o perfil dele, com foto típica de carioca suburbano, de bermuda no rolé, tênis doze molas, boné pra trás e blusão de grife, cheio de anéis, cordões e um relojão de pulso, com o canecão de cerveja na mão. Nós tínhamos vários amigos em comum, o que fazia total sentido, já que o motoboy morava umas cinco ruas depois da minha e ajudava os outros moleques do bairrinho a fazer eventos e festinhas de baile funk. Por conta de tudo isso, os vizinhos eram divididos entre quem gostava e quem detestava Felipe Cenoura e seu jeito de dirigir acelerado pelas ruas do bairro, com o vidro fumê fechado, ouvindo funk proibidão no último volume, fumando maconha e deixando marcas dos pneus no asfalto. Às vezes era a mil de moto, empinando sobre apenas uma roda e nem aí pra nada.

          - Mas hoje a danada não me escapa, mulher. Eu já tenho um plano pra descobrir o que essa menina anda fazendo. – escutei Soninha ainda conversando com a minha mãe na sala. – Hoje eu vou mandar Stephanie dormir na tia, só pra ter uma conversinha a sós com o Cenoura. Tenho certeza que ele vai aparecer atrás dela, toda noite é esse fogo!

          - Tem certeza, amiga? – minha coroa perguntou, cheia de curiosidade.

          - Claro que tenho! De hoje não passa, por anotar aí. Vou eu mesma falar com o Cenoura e amanhã você vai ficar sabendo.

          - Boa sorte!

          - Ele que fique esperto, vai ouvir bastante! Agora deixa eu ir lá que ainda tenho que buscar o mais novo no colégio, amiga.

          - Vai lá, Soninha! Dá um beijo no menino. Depois me conta como foi a conversa.

          - Vou contar sim. Até!

          - Até.

          Elas se despediram e foram juntas até o portão, me deixando sedento de curiosidade pelos próximos capítulos da história. Depois que minha mãe voltou pra dentro de casa e me encontrou na sala, começamos a fofocar sobre a situação da nossa vizinha e eu fingi que não tinha a menor ideia de quem era Felipe Cenoura, é claro.

          - Menino, você acha possível a Stephanie tá passando a perna na própria mãe?

          - Não sei dizer. – falei a verdade. – A Soninha tá tão p da vida assim?

          - Ôxe, você nem imagina! Se ela pegar o Cenoura pelo pescoço é capaz de esganar, de tanto ódio!

          - Eita! Então essa conversa entre eles promete, ein?

          - Ué, você não tava tomando banho nessa hora?! – ela fez cara de dúvida na mesma hora, suspendendo uma das sobrancelhas.

          Pensei rápido.

          - Casas antigas, paredes cada vez mais finas, não é verdade? – minha cara nem ardeu.

          Mentira, ardeu sim, porque minha mãe tirou o pano de prato do ombro e estalou na minha coxa na mesma hora.

          - Deixa de ser fofoqueiro, Félix! Arre! Vai arrumar o que fazer, menino!

          - Ah, olha quem fala, né? Hahahahahahaha!

          - Félix, Félix...

          - Tô brincando, mãe, é brincadeira!

          - Eu acho é muito bom, fi da disgrama!

          A coroa logo voltou pras coisas dela, eu voltei pras minhas, mas confesso que passei o restante da tarde pensando no que aconteceria e como seria o encontro da Soninha com o Cenoura, principalmente tendo a Stephanie no meio de toda a situação. Quando a noite chegou e minha mãe foi dormir, eu jantei, marquei um tempo na sala e depois fui fumar um cigarrinho no portão. Devo ter ficado no máximo dez minutos na calçada vendo a rua vazia, depois entrei e assisti TV até meia noite e pouca. Da mesma forma que antes, escutei o barulho dos pneus cantando, depois um funk alto e logo soube quem poderia ser. Acessei o circuito de segurança, fui direto nas câmeras e a cena foi parecida com a da outra vez, com um Corolla todo preto e de vidro fumê parando em frente à casa da Stephanie, porém do outro lado da rua e não exatamente no portão dela.

          - Putz, é agora! – fiquei ansioso, admito, pois não havia nada mais interessante do que fofoca no subúrbio, só o BBB... E por falar em BBB, enquanto isso, no edredom do quarto do líder, a coisa também pegou fogo, mas essa história fica pra outra hora.

Após uns três minutos, eis que o portão da nossa vizinha abriu e quem saiu de lá de dentro foi a própria Soninha, mãe da Stephanie, só de camisola, chinelos e cheia de bobes enrolados na cabeça.

          - Meu Deus, ela vai dar mesmo uma surra no Felipe! – ou pelo menos foi o que me pareceu naquele momento incomum.

          Sem hesitação, a coroa chegou perto da porta do carona do veículo, o vidro da janela abaixou e deu pra ver que ela começou a conversar com alguém, que presumi ser o motorista do Corolla preto, vulgo Cenoura. Já de cara, Soninha abanou a mão na frente do rosto e fez uma careta, dando a entender que não gostou do cheiro que sentiu dentro do carro.

          - Porra, já começaram mal. Esse cara deve ter fumado um monte de baseado ali dentro, socorro. – não parei de fazer notas mentais enquanto assistia. – É agora que ela vai acabar com a raça dele, heheheheehe!

          Apontadas de dedo, cruzadas de braço, mãos nas cadeiras, cara feia, tinha de tudo um pouco nas reações características e exageradas da amiga da minha mãe. Mesmo com a câmera do muro da minha casa não pegando toda a extensão do veículo e nem o áudio, era possível perceber nos movimentos rápidos que a coroa tava falando bastante, talvez colocando tudo pra fora e botando pra foder com a raça do Felipe. Foi aí que algo muito curioso e estranho aconteceu: Soninha se afastou do Corolla, andou até o portão de casa, olhou por alguns segundos e em seguida voltou correndo até o veículo. Simplesmente abriu a porta, entrou e eu dei um grito.

          - É O QUÊ!? PUTA MERDA! – tive que tapar minha boca pra não continuar berrando. – Mas que porra foi essa que acabou de acontecer aqui! Só pode ser piada, não é possível!

          Dei um pulo do sofá, fui correndo até o portão e ainda tive tempo de ver o carro se afastando e dobrando a esquina, no mesmo estilo de pneus cantando, funk proibidão tocando alto e o rastro de maconha de sempre. Não soube o que pensar ou o que dizer, só sei que senti um formigamento na pele e até pensei em acordar minha mãe pra contar tudo, mas fiquei na minha. Quer dizer, “fiquei na minha” entre aspas, porque uma inquietude fora do comum tomou conta de mim e não sosseguei até dar 1h27, que foi a hora que vi o Corolla preto parando novamente no portão em frente à casa da Stephanie. Dei um zoom na câmera e deu pra ver o momento exato em que a porta do carona abriu e uma figura sorridente e cambaleante saiu de lá de dentro.

          - PUTA QUE PARIU! – dei outro grito sem querer, mas pelo menos estava na sala de casa e ninguém me ouviu. – Que isso, maluco! Será que eles...

          Assim que saiu do carro, uma Soninha com cara de satisfeita ainda se debruçou com os cotovelos na janela do carona e ficou conversando de um jeito engraçado de ver, meio lenta, de olhos bem pequenos no rosto e rindo à toa, como se tivesse dado o melhor passeio de todos os tempos. Poucos minutos depois dessa cena, a vizinha finalmente se afastou, caminhou até o portão de casa e entrou, fazendo isso na pontinha dos pés e no maior silêncio possível. Só então o Corolla preto partiu dali e outra vez tornei a ouvir o já famoso barulho dos pneus cantando no asfalto da rua.

          - Caralho, ninguém vai acreditar nisso! – minha única conclusão plausível naquela hora foi essa, não que eu planejasse contar o que vi pra alguém.

          Pra ser sincero, nem pra minha mãe contei, justamente porque sabia que ela e Soninha eram amigas e que muito provavelmente minha coroa contaria tudo que eu vi pra ela. Não ter dito nada foi a melhor decisão que tomei, principalmente porque a própria mãe da Stephanie apareceu lá em casa na tarde do dia seguinte pra contar pessoalmente como foi a conversa com o suposto genro. Eu tava no meu quarto nesse momento, mas é claro que fiquei de orelha colada na porta, ouvindo tudo com muita atenção.

          - Menina, me conta. E aí, conversou com o tal do Cenoura? É ele mesmo que tá de papinho com a Ste, Sônia?

          - Amiga, eu nem te conto...

          - Conta, claro que conta! Tô curiosa, fala logo!

          - É, fala logo! – sussurrei do quarto. – Todo mundo quer saber, porra!

- Você acredita que aquele cachorro sem vergonha deu em cima de mim?

- MENTIRA!? – minha mãe deu um grito.

- Caralho, ela vai falar a verdade?! – eu também não acreditei.

          - Verdade, mulher! Aquele safado daquele moleque deu em cima de mim, amiga. Sabe o que ele teve a coragem de dizer?

          - Não, o quê?

          - Que panela velha é que faz comida boa! Agora você vê!? Garoto abusado, esse menino! Falta de respeito, isso sim!

          - Meu Deus do céu, Soninha! E você, fez o quê?

          - Eu o quê!? Claro que dei uma bronca nele, né?! Tá doida?! Esse rapaz é o meu futuro genro, não posso ser implicante.

- Ué, Soninha? Não tô entendendo... Você não disse que não queria ele com a Stephanie?

- Disse, disse. Mas você sabe como é, né? Filhos. A gente nunca entende muito bem a vontade deles. Fora que eu já tive a idade da Ste, sei que fogo é esse que ela tá sentindo

- Claro que sabe, velhota sem vergonha, até porque você também sentiu o mesmo fogo na buceta que a sua filha anda sentindo! Hehehehehhe! Bem que falam que as casadas são as mais safadas, ein? – falei comigo mesmo dentro do quarto, sozinho. – Eu sabia que ela não ia contar a verdade, sabia!

- Você... Sabe que fogo é esse que a Ste tá sentindo, amiga? – nem minha mãe acreditou no que ouviu. – Como assim?

- A gente já foi adolescente, mulher! Você nunca teve uma paixonite?

- Bom... É, talvez você tenha razão. Já tive sim, é normal mesmo. – mas se deixou convencer rápido demais.

Achei graça do papo delas, confesso, e continuei atento, porque a curiosidade só aumentava a respeito da trama envolvendo mãe, filha e genro.

- Tô te falando, eu entendo a Ste. Vou dar uns conselhos pra ela não acabar que nem as outras garotas dessa rua, esse é o certo a se fazer. É meu papel de mãe entender.

- É, é importante cuidar. Mas e aí, tô vendo que você mudou mesmo de ideia a respeito do Cenoura, ein, Soninha? O que você acha do seu futuro genro? Hahahahahahaha!

- O que eu acho? Ele não sabe se portar, senta todo aberto, fala alto, cheio de gírias e parece ser meio mandão. O carro tava com cheiro de maconha purinho, todo escuro e frio, sendo que ele nem tirou o funk cheio de palavrão pra falar comigo. Ah, e ainda tinha pacote de camisinha no porta-luvas, acredita nisso?!

- Camisinhas!? É um carro ou um motel? – minha mãe disse isso e me fez rir no quarto.

- É, não sei dizer. Mas... Pelo menos sei que tão usando camisinha, você não acha melhor? Quer dizer, imagina a Stephanie de barriga?

- E me fala uma coisa, esse rapaz te fez alguma grosseria?

- Bom... Eu perguntei quais são os planos dele com a Stephanie e ele perguntou quem era essa.

- Meu Deus! O Cenoura não sabia o nome dela!?

- Disse ele que não. Que tem várias namoradinhas e que, pra ser sincero, só tá pensando em tacar o pau na Ste e ralar. Respondeu assim mesmo pra mim, amiga, ainda falou que é disso que as mulheres gostam, sexo sem compromisso. Acredita?

- Jesus do céu! E você, Soninha, respondeu o que pra esse garoto?!

- Eu vou fazer o quê, mulher? Falei pra ele que não quero minha filha envolvida com esse tipo de elemento. Mas conversei com a Stephanie antes e ela disse a mesma coisa.

- O quê, que não quer namorar com o Cenoura?

- Não. Que também não tem planos com ele, só quer transar sem compromisso.

- Misericórdia! E você vai deixar, Soninha?! Caramba!

- Proibir não vai adiantar, minha filha. Eu tenho é que orientar, isso que eu tenho que fazer. Cedo ou tarde ela vai sentir vontade de transar, não tem jeito. Única solução é ensinar a usar camisinha, tomar anticoncepcional... Botar juízo na cabeça da Stephanie, entendeu? É o que eu tô tentando fazer agora.

- Entendi, entendi. Poxa... Então que ótimo que ela tem uma mãe que tá do lado dela, né? – minha coroa tentou ser otimista. – Já pensou se ela dependesse do pai?

- É, pois é. Foi por isso que eu te disse que queria ser mais próxima da Stephanie. Tô conseguindo. Não foi do jeito que eu esperei, mas agora tá dando certo, tamo conversando mais.

- Que bom! Fico feliz por vocês.

- Demais, amiga.

Depois que elas mudaram de assunto, parei de bisbilhotar a conversa pela porta do quarto, deitei na cama e fiquei pensando em tudo que estava vendo e ouvindo acontecer. Por que, afinal de contas, a Soninha entrou no carro do Cenoura, ficou dando rolé com ele e agora estava contando outra história pra minha mãe? Quero dizer, ela pode até ter contado um pouco da verdade quando disse que conversou com o motoboy e falou sobre a Stephanie, mas a coroa estava claramente mentindo quando não contou o que de fato fez dentro do carro do próprio genro durante quase uma hora e meia na madrugada. Permaneci pensativo por várias horas sem sair do quarto, só mexendo no meu celular, observando o perfil na rede social do Felipe e tentando maquinar qual era o lance dele com a vizinha e amiga de mamãe. As horas se passaram, a noite chegou e, da mesma forma que antes, esperei minha mãe dormir e outra vez fiquei atento à câmera do portão, ciente de que alguma coisa certamente aconteceria. E não deu outra: lá pras 2h, eis que novamente a Sônia saiu na pontinha dos pés, de camisola e bobes na cabeça, e ficou na calçada esperando pelo Corolla preto. O carro chegou, ela entrou e mais uma vez saíram pra outro rolé de mais de uma hora de duração.

- Não é possível que essa mulher não esteja sentando no Cenoura! É claro que ela é a maior sem vergonha e tá mentindo pra minha mãe, eu tenho certeza! – garanti a mim mesmo, enquanto assistia àquela cena.

A madrugada foi rolando, o veículo escuro voltou ao portão da minha vizinha e a porta abriu, com a Soninha saindo do carona do mesmo jeito que da outra vez: visivelmente derretida, trôpega e de pernas bambas, pra não falar do sorriso largo de uma orelha à outra. Tava mais do que na cara que a dupla de sogra e genro estava trepando na calada da noite, muito provavelmente dentro do carro e escondidos de todo mundo, inclusive da Stephanie. Ou pelo menos era isso que eu pensava, porque meia hora depois, quando deu 2h30, adivinha quem eu vi pulando o muro de casa e sumindo no fim da rua pra entrar no mesmo Corolla preto onde a mãe havia entrado minutos antes? Ela mesmo, a filha assanhada. Sem medo de ser feliz, Ste foi encontrar com o Cenoura e confesso que essa cena me deixou de queixo caído, simplesmente por perceber que o que tava rolando entre os três era a maior putaria que ninguém imaginava. Enquanto a amiga da minha mãe contava uma coisa nas conversas da tarde, saía na madrugada para fazer outra completamente diferente e ninguém desconfiava disso, exceto eu.

- “Cara, mas parando pra pensar... Será que o Cenoura é tão bom de papo mesmo?” – minha mente não deu um minuto de sossego. – “Porque não é possível que ele esteja comendo mãe e filha assim tão fácil, na boa! Eu não consigo acreditar nisso, de verdade... Só pode ser coisa da minha cabeça.”

Pra me deixar ainda mais pensativo e cheio de coisas na cachola, foi nessa mesma semana que começaram a circular vários vídeos do mesmíssimo Corolla preto nos grupos do bairro, tanto no Facebook quanto no WhatsApp. Três, quatro cenas do veículo parando aleatoriamente perto de moças pela rua e elas entrando no carro sem dar explicações. Na praça, na minha rua, perto da favela do bairrinho, uma mulher, depois duas amigas, em seguida três minas entrando juntas no carro suspeito, e eu sem qualquer sombra de dúvidas de que se tratava do Cenoura no banco do motorista, só não tinha como provar isso ainda. Aliás, provar é a palavra certa para usar, porque quanto mais eu pensava e via os vídeos, mais queria entender o que se passava dentro daquele Corolla sinistro.

De tão curioso que fiquei, eis que enchi a cara numa sexta-feira quente do subúrbio, peguei o celular e, sem pensar, criei uma conta falsa chamada “Mila Camomila”, usando a foto de uma atriz pornô morena e com cara de amadora. Não hesitei em momento algum, tampouco senti medo, a ficha só caiu mesmo quando me vi adicionando o Felipe Cenoura na rede social com esse perfil falso e o marmanjo aceitou em questão de minutos, me fazendo dar um pulo do sofá.

- Boa noite, Mila. A gente se conhece? – o ruivo mandou mensagem praticamente na mesma hora que me aceitou. – Tu é da onde?

- Oi. Não nos conhecemos ainda. Eu moro no bairrinho também, sou uma fã. – menti. – Tudo bem?

- Melhor agora, kkkkkk. Vem cá, tu é essa mina aí da foto, é?

- Sou sim, por que?

- Porra, mó gatona que tu é! Como é que eu faço pra te conhecer? Dá o papo.

- Bom... – pensei brevemente e achei melhor ir direto ao ponto. – Eu fiquei sabendo da fama que você tem aqui no bairro, Cenoura. Gostei do que ouvi.

- Caô?! KKKKKKKKK! Qual delas? Porque são muitas famas.

- A sua fama de putão. Sei que você adora comer minhas amigas casadas e novinhas solteiras aqui do bairro.

- Porra, tá sabendo bem, ein? Kkkkkkk! E tu é o que, mais uma querendo ganhar chupada na bucetinha? Minha especialidade é oral, por isso que elas voltam. Kkkkkk!

O jeito desinibido de falar, a ousadia íntima em tão pouco tempo de contato, a voracidade masculina presente em seu discurso desde a primeira frase trocada comigo pensando que eu era mulher... Cenoura me deixou muito excitado, apesar de eu estar mentindo pra ele. O simples fato de ter a atenção daquele safado por alguns minutos e num sentido explicitamente sexual fez meu fogo subir, preciso admitir. O motoboy foi direto ao meu pote, não fez qualquer rodeio e tudo isso demonstrou o quão prático e direto ele era na hora de lidar com sexo, mulheres e bucetas.

- É sério que você é bom assim de língua, cachorro? – não segurei a onda.

- Pai é o terror da linguada nervosa, safada! Meto a língua na tua xerequinha, depois soco no cuzinho, te dedo e tu fica toda molhadinha no grelo. Tá a fim de experimentar?

Meu coração acelerou no peito. Como prosseguir, sendo que eu tava mentindo na cara de pau? O tesão me moveu além da racionalidade e quando dei por mim...

- Eu tô interessada em dar pra você, mas acho que cê não vai curtir. – deve ter sido a primeira verdade que eu disse durante nossa conversa.

- Por que não? Meu bagulho é bucetão e rabão. Se tiver isso eu já tô dentro, tem caô não. Só piar no meu setor, princesa. Entra no meu carro-bicho, bora?

- Tem certeza?

- Absoluta, porra! Vem na minha direção que tu vai sair com as pernas tremendo. Mas ó, já aviso que tô sempre caçando, só não pode querer se envolver, já é? Jogo aberto.

- Por mim, melhor ainda. Mas tem um porém... Eu só curto dar o cuzinho, acho que você não vai gostar. – cheguei a dar uma piscada fogosa quando digitei na tela do celular, ao ponto das pregas morderem o pano do shortinho. – Aff, até pisquei só de falar disso, acredita? Rsrs...

- Por que eu recusaria um cuzinho!? Tá doidona? Kkkkk! Chupo que nem buceta, comigo não tem tempo ruim, não! Aliás, por que tu não manda uma foto da cucetinha pra gente já ir se conhecendo?

- Deixa pra me conhecer pessoalmente. Eu sou tímida, rs.

- Tá, por mim tá beleza. Mas se liga no papo...

Aí, de repente, o Cenoura ficou offline no chat da rede social. Sumiu, não disse mais nada e eu comecei a pensar que dei algum mole e fui descoberto no meu disfarce. O sentimento de nervosismo cresceu em mim, esperei que alguma coisa fosse acontecer muito em breve e foi aí que aconteceu mesmo. Uma senhora piroca grandona e cabeçuda apareceu na tela do meu chat com o motoboy, sendo a glande muito maior e mais grossa do que o restante do corpo taludo e reto, além de bem solta. Devia ter, sei lá, uns 19 ou 20cm brincando, isso se eu fosse apenas chutar. O freio curto, firme e tão escuro quanto as dobras da vara em si, pois afinal de contas, o instrumento era inexplicavelmente mais moreno do que o tom de pele claro do Cenoura, incluindo o saco liso e pesadão. Por falar no apelido, ali estava a pentelhada mantida curta, aparada, genuinamente avermelhada e em reflexos escuros de ruivo, combinando com o cenário escuro da genitália do caralhudo. A pilastra era incrivelmente reta, da uretra bem visível e nem um pouco torta, parecendo um espigão de pica apontado pra frente, tudo isso na mesma foto enviada pra mim.

- PUTA QUE PARIU! É por isso que te chamam de Cenoura, é!? Vai se foder, que pirocão enorme!

- Gostou, sua puta? Será que vai caber tudinho na tua bunda, ein?

- Vai querer comer meu cuzinho, seu guloso? Pensei que fosse só linguar.

- Sou tarado em bunda, tu não faz ideia. Meus parceiros até me gastam com isso, sem neurose. Kkkkkkk! Tu vai ver no ao vivo.

Eu já tava hipnotizado, completamente seduzido pela nude explícita e enraivecida que o entregador me mandou. Bastou olhar praquele porrete ereto e meu pau endureceu no short, minha boca encheu d’água e o cuzinho piscou violento, resultando na certeza de que eu tinha que encontrar com o Felipe, independentemente do que fosse acontecer. Sei lá, eu não soube explicar o que senti na hora, apenas me lembro do tesão transbordando em mim e de uma enorme certeza de que precisava arriscar, por isso mantive o disfarce e levei nosso encontro adiante. Sim, um encontro.

- “Meu Deus, aonde é que eu tô com a cabeça!? E se essa merda der errado?! Caralho, que mentiroso que eu sou!” – minha mente martelando o tempo todo, eu mega nervoso pelo que tava fazendo e completamente perdido na razão e no tesão.

Marcamos para a madrugada seguinte, porém não dei o número da minha casa, dei o de um casarão que ficava na esquina da minha rua, por via das dúvidas. O trato era o Cenoura chegar de carro e aguardar por mim, só que ele não sabia que eu era um cara, então é claro que o safado nunca me veria chegando. Ou melhor, até veria, mas não ia ter a menor noção de que foi comigo que conversou putaria e mandou foto do pirocão. Entre outras palavras, eu tava meio que resguardado, porém não tinha qualquer certeza de que aquele plano poderia me fazer sentar de bunda na vara do motoboy, até porque era arriscado, não tinha pé e nem cabeça, foi tudo absurdamente maquinado pelo meu tesão inconsequente. Assim, quando deu duas horas da madrugada seguinte, lá estava eu de olhos bem atentos à imagem da câmera externa. Sentado no sofá, de banho tomado, todo limpinho, cheiroso e macio, de pernas tremendo por nunca ter feito uma putaria antes, mas preparado para o que poderia ou não acontecer naquela noite. Mesmo dentro de casa, escutei o barulho dos pneus cantando no asfalto, depois veio o funk alto e eu logo soube que o Cenoura tava por perto. Pela câmera, vi que ele passou no Corolla preto pro final da minha rua e não parou na esquina onde combinamos, o que me deixou apreensivo.

- Putz, será que eu dei algum mole? – qualquer coisa anormal que acontecia e eu já tava pensando que havia vacilado, tudo por conta da ansiedade e do nervosismo diante da situação que eu mesmo aprontei pra mim. – Será que ele volta? Deve voltar... Porra, daqui não dá pra ver o carro.

Tentei mover a câmera, mas não adiantou de nada, pois o veículo havia saído do alcance e passado muito além da esquina. Isso me deixou não apenas nervoso, como curioso e cheio de fogo no cu, então acabei saindo na pontinha dos pés, fui pro portão e cheguei na calçada pra ver até onde o Cenoura tinha ido. Virei meu corpo na direção do fim da rua, vi a esquina vazia e nenhum sinal do ruivo maconheiro. Minha cabeça ficou girando, eu tentando pensar no que poderia ter acontecido pro gostoso ter ido embora, até que um clarão de luz veio de trás de mim e um ronco de motor me fez dar um pulo de nervoso.

- Puta merda! – virei pra trás na mesma hora e dei de frente com um Corolla sinistro, preto e furioso, roncando perto de mim, ao ponto de arrancar fumaça e cheiro de borracha queimada do asfalto.

Não dava pra ver quem estava dentro porque todos os vidros eram fumê e estavam fechados, me deixando de pernas tremendo. Respirei fundo, pensei no que fazer e achei melhor me mover antes que o carro arrancasse de onde estava e partisse pra cima de mim. Andei de volta pro meu portão, imaginei que conseguiria entrar em casa, mas foi aí que o motorista parou de acelerar, dirigiu até onde eu estava e estacionou na beira da calçada. Quando o vidro abaixou, a primeira coisa que eu vi foi a fumaça branca e densa saindo, o cheiro de maconha potente entrou pelas minhas narinas automaticamente, mesmo sem eu querer, e uma versão do Poesia Acústica atravessou meus ouvidos. Uma mão enorme abanou no ar, a cortina de vapores foi se desfazendo na janela do motorista e um black power curto e avermelhado se tornou visível.

- Coé, boa noite! – a voz arrastada e carregada de fumaça me arrepiou dos pés à cabeça. – Meu nome é Cenoura, tudo tranquilo?

- O-Opa, boa noite! P-Prazer, Félix. – tentei conter o nervoso, mas foi difícil, porque eu ainda era virgem e tava cheio de medo das consequências da minha falta de noção por estar ali, frente a frente com o Felipe. – Tudo indo, e com você?

- Ah, comigo de boa, mano. Aliás, de boa não, tá rolando um caô aí...

- C-Caô? Como assim? – banquei o bobo, respirei fundo e acendi um cigarrinho pra ajudar a estabilizar os ânimos. – Aconteceu alguma coisa?

- Aconteceu, tá acontecendo... – ele botou o vape na boca, puxou mais fumaça branca, tragou e jogou pra fora da janela, falando com a voz carregada e num volume tão marcante quanto o do som dentro do carro. – Se liga, tu tá esperando alguém, Félix?

- E-Eu? N-Não, só vim fumar um cigarro antes de dormir. Por que a pergunta?

- Hmmmm, saquei. É que eu marquei de dar uma linguada no cu de uma mina hoje, tá ligado? Mas tô achando que a cachorra me deu um bolo. Mó ideia torta, pegou visão?

- S-Sério!? Nossa, quanta sinceridade da sua parte em me contar os detalhes, ein? Hahahahaha!

- E, ué, tô te dando o papo reto. Mas fala tu, o que eu devo fazer, espero pela mina ou volto pra casa?

- Ah, espera, pô... – respondi sem pensar. – Vai que ela aparece?

- E se ela não brotar, o que eu faço, irmão?

- Bom... Dizem por aí que cu é cu, né? Não se deve desistir assim tão fácil. Se ela disse que ia deixar você linguar o rabo dela, então vale à pena esperar, cê não concorda?

Antes de responder, ele suspendeu uma sobrancelha, riu de canto de boca e concordou comigo.

- Com certeza, irmão! Tudo bem que eu brotei um pouco atrasado, mas que mina não esperaria pra tomar uma linguada no anel, fala tu?

- Verdade. Hhaahahaha! De repente ela se atrasou porque tá limpando.

- É. Mas dá o papo, se tu fosse ela, esperaria? – fez a pergunta e me olhou de baixo a cima, sorrindo sacana no meio disso.

Suei, fiquei vermelho, mas tive que responder rápido pra parecer natural e isso acabou me fazendo ser sincero até demais.

- Bom, n-não sei direito, eu acho que... Você quer dizer se eu fosse mulher? Acho que esperaria sim, sexo é bom, né? – só depois que respondi que pensei na pegadinha que caí, já que eu basicamente afirmei que optaria por aguardar para levar linguada no cu. – Quer dizer, não sei bem, é uma pergunta de duplo sentido, então dá pra ficar confuso... Eu mesmo tô confuso agora, não sei como responder. Hahahahahaha! Pulo, muito difícil essa.

- Hehehehehehehe! Tá se enrolando pra responder, irmão? Qual foi?

- Porra, essa não é qualquer pergunta, né, Cenoura? Até você concorda, vamos combinar. Tamo falando de lambida no cu, pô, tem noção?

- Ah, vai dizer que tu não gosta? HAHAHAHAHAHA! Geral se amarra!

O jeito que ele falava me deixou sem saber se todo mundo gostava de dar ou de receber lambida no cu, por isso que levei na esportiva, encarei tudo como uma boa piada e fiquei rindo na calçada, enquanto fumava um cigarrinho e batia um papo cada vez mais descontraído com o sacana do Felipe. Cheguei a perder boa parte do nervosismo conforme a gente se conhecia, porém novamente meu coração saltou e as pernas voltaram a tremer quando o motoboy tornou a rasgar o motor do Corolla e fez mais fumaça sair do asfalto, porque foi nesse mesmo minuto que escutei a pergunta que mudou drasticamente a minha madrugada.

- Qual vai ser, tá a fim de dar uma volta comigo, cria?

- Sério!? C-Contigo?! Tipo, agora? De madrugada? Do nada?!

- É, pô, qual o caô?

- M-Mas e a sua mina? Ela não vai ficar bolada contigo?

- Algo me diz que ela não vai brotar. Me deu um toco. Bora dar um rolé ou não?

- Poxa, é que... Eu tô... – pensei o mais rápido que pude. – Tô meio que fugido na rua, sabe? Minha mãe acha que eu tô no quarto dormindo, é isso.

- Então. Tá fugido mesmo, qual a diferença? – destrancou a porta do Corolla preto. – Aproveita logo, entra aqui.

Não recomendo que qualquer pessoa faça o que fiz, pois minha decisão foi a mais inconsequente e irresponsável possível, tudo devido ao enorme fogo no cu e à grande oportunidade de finalmente perder o cabaço. Senti um novo nervoso carcomendo meu corpo e minha pele, mas agora não foi tão negativo, apesar de ainda estar com medo de pra onde iríamos e do que ele pretendia fazer comigo, porém havia também uma espécie de fagulha, uma energia que tomou conta de mim a partir daquele momento e me deixou cheio de luxúria. Assim que eu decidi que ia realizar meu sonho de entrar naquele carro, fechei o portão de casa, olhei na câmera de segurança no muro e dei um sorriso de piranha, simplesmente por saber que agora era eu no flagrante da madrugada, escondido na calada da noite da mesma forma que minha vizinha Soninha e sua filha Stephanie fizeram. Enfim, dei a volta no carro, fui pro lado do carona, abri a porta e senti o frio de montanha cobrindo minha pele na mesma hora. Entrei, sentei, fechei a porta, Cenoura travou os trincos e finalmente me encarou do seu lado, dando o sorriso mais safado que já vi nessa vida.

- E aí, pra onde é que cê vai me levar? – deixei a curiosidade aflorar.

- Tem algum lugar específico que tu queira ir?

- Não, nada em mente. Achei que você já tinha pensado em algo.

- Nada, meus planos eram outros. Mas vamo dar um pulo ali, acho que tu vai se amarrar...

- Boa. Quero ver, então, me surpreenda. – fiquei animado, confesso.

- Tu vai mesmo ficar surpreso, Félix. Hehehehehe!

          Clima frio, o funk tocando baixo, cheiro de maconha, luzes coloridas no aparelho de som e o Cenoura mandando ver na direção, sempre andando acelerado, mas com muita precisão na hora de usar o freio pra passar nas lombadas e fazer as curvas. O jeito como ele botava o carro praticamente de lado pra passar nos quebra-molas me deixou um pouco nervoso, confesso, mas sua maestria com as mãos nos volantes e os pés nos pedais foram fora de série.

- Se assusta não, eu sou piloto de fuga, irmão! Hahahahahahaha!

- Tô vendo! – tive que me segurar no painel à minha frente algumas vezes, isso porque estava de cinto.

A voz masculina cantando putaria nos autofalantes da mala do veículo também me deixou quente, principalmente por conta dos versos que pareciam ter a ver com a nossa situação naquele momento. Era um funk acelerado e feito pra dançar, com o gemido de uma mulher no fundo enquanto o MC cantava sacanagem e o pilantra do Cenoura acompanhava, cantarolando e dirigindo acelerado.

- Fica à vontade no trem. Hoje a tropa tá foda! Bico pra fora, fumaça sobe, só podcast dentro do Corolla. Ela de giro comigo. Ganha segunda ladeira. Uma mão vai no piloto, outra catuca a buceta! Elas sabe disso que o tesão tá no perigo. Foda inesquecível dentro do meu carro bicho! No banco de trás, só coro com coça. Melhor sexo da sua vida foi dentro de um Corolla! Carro bicho, carro bicho!

Eu não tinha a menor ideia de pra onde a gente tava indo, só sei que confiei plenamente na habilidade dele de fumar maconha e dirigir tão rápido, enquanto cantava o funk estourando nas caixas. Nem tive tanto tempo pra manjá-lo até então, porque tava muito curioso pra ver onde a gente ia chegar a qualquer momento. Foi aí que comecei a achar o visual mais distante e rústico, inacabado, pegamos uma subida e, quando dei por mim, estávamos num dos cantos mais distantes do bairrinho, precisamente subindo o morro e passando por homens fortemente armados. Fiquei nervoso na mesma hora, não consegui mais segurar a onda e o Cenoura percebeu a minha falta de naturalidade diante da situação.

- Ih, qual foi, tu nunca brotou da favelinha, não? Mora no bairro e não conhece nada, é? Hahahahahaha! Pensei que tu fosse cria, pô, mas tô vendo que tu é criado. Hehehehe!

- Não vou mentir, sou desacostumado à beça com comunidade. Tipo, nunca entrei em uma, então não tenho como ficar tranquilo, cê concorda?

- Só relaxa, já é? Fica tranquilão na tua e me acompanha, só isso.

- Tá bom, vou tentar. – respirei fundo.

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